“Quem espera sem alcança, prega o hino do Fluminense. Mas foi um outro tricolor, o Fortaleza, que tirou a prova real desse verso. Ontem (23), o clube o acesso à Série B do Brasileirão, após esperar por oito anos. Anos esses em que, salvo uma ou outra exceção, repetia-se sempre o mesmo filme: jogo decisivo com casa cheia — no Presidente Vargas ou no Castelão, que depois virou arena —, derrota e closes desesperados das arquibancadas.
É a parte final desse roteiro que nos interessa.
Sim, porque, os closes de desespero das arquibancadas só se repetiram, campeonato após campeonato, porque os torcedores estavam lá, derrota após derrota, esperando alcançar o acesso. Uma obstinação que, para quem é de fora (FutMKT por exemplo, está baseado no eixo Rio-São Paulo) pareceu um ato de fé. Ou, traduzindo para o marketês, um ato de lealdade.
O torcedor leal supera o fiel, porque, grosso modo, não precisa — ou não exige — resultados ou compensações para perceber valor no seu clube. E defendê-lo. Advogar em seu favor. O leal é aquele cara que ostenta a camisa pela rua no dia seguinte a uma grande derrota. Ou o que lota o estádio na decisão seguinte àquela perdida na temporada anterior.
Assim fez a torcida do Fortaleza. Se considerarmos que o único sucesso desse período foi um fracasso disfarçado — a fuga da Série D na última rodada de 2011 —, quanto menos o “leão” demonstrava merecer, mais o povão chegou junto. Acompanhe:
SÉRIE C 2010
— Partida: Fortaleza-CE 1×1 Rio Branco-AC;
— Decisão perdida: vaga para o mata-mata de acesso;
— Público: 24.188.
SÉRIE C 2011
— Partida: Fortaleza-CE 4×0 CRB-AL;
— Decisão vencida: permanência na Terceirona;
— Público: 7.354.
SÉRIE C 2012
— Partida: Fortaleza-CE 1×3 Oeste-SP;
— Decisão perdida: acesso à Série B;
— Público: 20.062.
SÉRIE C 2013
— Partida: Fortaleza-CE 1×3 Oeste-SP;
— Decisão perdida: vaga para o mata-mata de acesso;
— Público: 53.134.
SÉRIE C 2014
— Partida: Fortaleza-CE 1×1 Macaé-RJ;
— Decisão perdida: acesso à Série B;
— Público: 62.525.
SÉRIE C 2015
— Partida: Fortaleza-CE 0x0 Brasil-RS;
— Decisão perdida: acesso à Série B;
— Público: 62.903.
SÉRIE C 2016
— Partida: Fortaleza-CE 1×1 Juventude-RS;
— Decisão perdida: acesso à Série B;
— Público: 63.903.
A lealdade da torcida do Fortaleza, porém, foi além dos momentos decisivos. Entre 2010 e 2016, as médias de público das arquibancadas tricolores na Série C ficaram abaixo das registradas na elite em apenas duas temporadas. Confira:
TEMPORADA 2010
— Média de público na Série A: 14.839;
— Média de público do Fortaleza: 17.631 (1º).
TEMPORADA 2011
— Média de público na Série A: 14.664;
— Média de público do Fortaleza: 8.971 (3ª).
TEMPORADA 2012
— Média de público na Série A: 12.970;
— Média de público do Fortaleza: 14.574 (2ª).
TEMPORADA 2013
— Média de público na Série A: 14.951;
— Média de público do Fortaleza: 13.385 (3ª).
TEMPORADA 2014
— Média de público na Série A: 16.337;
— Média de público do Fortaleza: 18.812 (1ª).
TEMPORADA 2015
— Média de público na Série A: 17.050;
— Média de público do Fortaleza: 18.073 (2ª).
TEMPORADA 2016
— Média de público na Série A: 15.239;
— Média de público do Fortaleza: 17.385 (2ª).
Não é por acaso que o próprio Fortaleza ativou a relação time-torcida para o mata-ata de acesso contra o Tupi-MG com o duo #TimeDeLeões e #TorcidaDeLeais. Deu certo de cara: no primeiro jogo, que aconteceu na Arena Castelão — invertendo os roteiros dos anos anteriores —, vitória por 2×0 diante do maior público da Série C até aqui (40.102). Na volta, uma invasão a Juiz de Fora, com o tanto de drama que consagra um final feliz: derrota por 1×0, deja-vus dos anos anteriores e, enfim, o triunfo da lealdade — acesso com derrota; ganhou-se perdendo, em contraste com os últimos anos, e que nem sempre se perdeu, mas o tricolor sempre saia derrotado.
Essa epopeia do torcedor tricolor cearense é, para nós, um case de marketing e tanto. Afinal, que marca não gostaria de ter tanta gente ao seu lado — crítica, mas também incondicionalmente — mesmo nos piores momentos? Esperamos que o Fortaleza continue ativando essa lealdade, tanto por meio de produtos (livro, documentário, camisa especial, o que couber para eternizar essa história) como em ações de valorização dos torcedores e sócios para a tão esperada reestreia na Série B.
Lealdade não tem preço, mas sempre paga no final. Que a nossa cartolagem tenha entendido o recado — e que os cardeais do Fortaleza não o esqueçam.
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Thiago Zanetin tem 31 anos e é redator publicitário na Concêntrica Comunicação e Conteúdo. Fanático seguidor do Hellas Verona, sonha com o dia em que as verdadeiras cores gialloblù da cidade voltarão a brilhar na Europa.
Imagens: Bruno Ribeiro/GE.com (1); Divulgação (2 a 7); O POVO (8).
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